Valdir Lamim Guedes Junior (*)
Desde 1971 comemora-se, no dia
20 de novembro,
o "Dia Nacional da Consciência Negra". Nessa
data, em 1695,
foi assassinado Zumbi,
um dos últimos
líderes do Quilombo dos Palmares,
que se transformou em um grande ícone da resistência negra ao escravismo e da
luta pela liberdade. O 20 de novembro foi instituído como data de referência para
o movimento negro
em contraposição ao
13 de maio,
quando foi decretada
a abolição da escravatura, a chamada Lei Áurea, pela princesa Isabel, em 1888.
O 13 de maio geralmente é visto como a celebração da generosidade de uma branca
em relação aos negros, em vez de enfatizar a própria luta dos negros por sua libertação.
Um dos objetivos deste dia é
mostrar o quanto o país está marcado por diferenças e discriminações raciais,
já que o tema do racismo quase sempre foi negado, dentro e fora
do Brasil. Nesta data, somos todos convidados a refletir sobre a inserção do
negro na
sociedade brasileira.
"O Brasil
nunca teve uma
segregação racial formal,
institucionalizada. Mas não teve porque não
precisou, estava na
regra social, ela
era praticada, não
precisa ser institucionalizada"1.
E um fator que ameniza as tensões sociais é a miscigenação: "A mestiçagem
criou no Brasil uma sensação de harmonia e acomodação dos diferentes povos que
constituíram esse povo, povo brasileiro. Uma aparente afetividade entre os diferentes"2.
O preconceito no Brasil é uma coisa feita cotidianamente, no entanto, é mascarado, ás
vezes a discriminação
está menos nas
palavras e mais no jeito
de olhar,
em atitudes, desconfiança.
A idéia de valorizar a
cultura e história dos negros no Brasil não é um fator que reforça o racismo. Isto vem
de encontro com
a própria construção
complexa do povo brasileiro. É dizer:
"Sou negro, sou
brasileiro, quero meus
direitos e ser
respeitado como sou". É
assumir a ascendência
e a história
dos negros. É
estar ciente da contribuição para a
diversidade de nossa sociedade. Orgulho de uma ascendência que não precisa ser
maquiada.
Com este discurso temos a
busca de um ideal, o da diversidade real, da aceitação das
diferenças culturais e da igualdade entre as pessoas. Apesar do
foco deste dia ser o racismo contra afro-descendentes, pode
ser visto também
como o dia
de todos os brasileiros e brasileiras que lutam por
uma sociedade democrática de fato e igualitária, unindo-os num
projeto de nação
que contemple a
diversidade própria do
nosso processo histórico. Um projeto de nação deste tem por trás a idéia
de sustentabilidade, em várias dimensões.
Segundo Ignacy Sachs3
(1993 apud Nunes,
2005)4 a sustentabilidade tem
cinco dimensões: social, econômica,
cultural, ecológica e espacial.
A dimensão social
da sustentabilidade está relacionada à outra idéia de sociedade, na
qual o "ser" é mais importante
que o "ter", maior
distribuição do "ter", visando
diminuir a distância socioeconômica entre
as pessoas. A dimensão
econômica refere-se a um equilíbrio entre as
nações (Norte/Sul), maior
transferência de renda,
que os avanços macrossociais são mais importantes
que o lucro das empresas. A dimensão ecológica focada num
uso responsável dos recursos naturais,
incluindo com o
aumento de tecnologia
para diminuir os impactos sobre o meio ambiente. A espacial relaciona-se busca de
uma configuração rural-urbana
mais equilibrada, com
melhor distribuição territorial de assentamentos humanos e atividades econômicas. E uma
quinta dimensão, a
cultural, relacionada ao
respeito das especificidades de cada local, valorizando a
cultura deste. Ao dar ênfase nestas dimensões, o autor deixa claro que para
alcançarmos a sustentabilidade temos que valorizar as pessoas, seus costumes e
saberes. Por exemplo,
neste processo de
valorização, a escola
tem um papel central, porque
durante a abordagem
educativa deve-se demonstrar
uma equiparidade entre as culturas, sem uma escala de importância, pois
ao valorizar uma cultura em prol de outras estamos recriando relações de
dominação e submissão.
Ao dar esta visão a sustentabilidade, Sachs deixa escancarado que
ao se falar neste tema deve-se ter
uma visão holística
dos problemas da
sociedade, não focando apenas no meio ambiente e recursos
naturais. Pensar em sustentabilidade é pensar em algo
muito mais profundo,
que visa uma
verdadeira metamorfose do
modelo civilizatório atual.
O desafio relacionado à questão racial no Brasil tem um problema
tão sério quanto às diferenças socioeconômicas entre brancos e negros5 e o
preconceito velado de cada dia, é que a cobertura dos assuntos de interesse da
população negra no Brasil pelos grandes
jornais e revistas
reproduz posições contrárias
a ações afirmativas,
como cotas em universidades e o reconhecimento de terras remanescentes
de quilombos5.Esta é uma
atitude muito negativa,
porque além de
criticar medidas tomadas
para reduzir as diferenças
sociais no Brasil,
ainda influenciam a
grande massa com o discurso
de que as ações afirmativas são racistas ou então que o racismo não ocorre no país.
Um projeto de nação que vise um desenvolvimento socioeconômico
mais sustentável passa por um
novo posicionamento em
relação às questões
raciais no nosso
país, somos
indiscutivelmente
miscigenados e temos
que aceitar esta
condição como um ponto que nos aproxima e também que nos deixa mais fortes.
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(*) Valdir Lamim Guedes Junior
Mestrando em Ecologia
de Biomas Tropicais,
Universidade Federal de
Ouro Preto. E-mail: diguedes@yahoo.com.br
1 Sevcenko, Nicolau. Entrevista para a Frente 3 de fevereiro. In:
Zumbi Somos Nós: democracia racial, pág
56. Disponível em , acesso 22/Nov/2009.
2 Zumbi Somos Nós: democracia
racial, pág 57. Disponível em acesso 22/Nov/2009.
3 Sachs, Ignacy. Estratégias de Transição para o século XXI:
Desenvolvimento e Meio Ambiente. São Paulo: Studio Nobel. 1993.
4 Nunes, El en
Regina Mayhé. Alfabetização
Ecológica: um Caminho
para a Sustentabilidade.
Porto Alegre: Ed. Do Autor. 2005.
5 Dossiê EcoDebate:
Consciência Negra e o ´retrato´ da desigualdade. Disponível em acesso 21/Nov/2009.
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