Em Uganda, no coração da África, os contadores de
histórias dizem que, antigamente, o gato e o rato viviam juntos e eram muito
amigos.
Os dois parceiros plantavam, colhiam, armazenavam o
produto do seu trabalho e pequenos celeiros de barro cobertos com palhas.
Um dia, o rato resolveu que devia guardar o leite
também, da mesma forma que os homens faziam para não passar fome durante a
estação da seca.
- De que jeito? - questionou o gato - em poucos
dias o leite estará azedo.
- Deixe comigo – respondeu o rato – Eu aprendi como
as mulheres preparam uma manteiga que eu adoro, a qual elas chamam de ghee.
Então, sob o comando do rato, os dois amigos deram
início ao longo processo. Assim que acabavam de ordenhar as vacas, de chifres
enormes, punham o leite numa sacola de couro, durante alguns dias, para
fermentar. Depois balançavam a bolsa, pendurada por uma corda no galho de uma
árvore, para lá e para cá. Em seguida, retiravam a espuma que ia formando-se no
topo , colocavam-na em uma panela e ferviam até que a manteiga ficasse no
ponto.
No fim da estação da colheita, os compadres tinham
um pote cheio de ghee. Para que o gosto ficasse melhor, adicionaram
neles uma série de temperos. Mas ainda havia um problema para resolver.
- Onde vamos guardar o ghee? – perguntou o
gato – Tem que ser num lugar seguro, pois não confio muito em você – falou o
felino, olhando com desconfiança para o amigo. – Conheço bem as suas fraquezas.
- Você tem razão. O simples cheiro do ghee
me deixa com água na boca. Vai ser difícil resistir – conformou-se o rato.
- Pra ser sincero, o ghee não estaria a
salvo comigo também – replicou o gato – alisando os bigodes.
Depois de uma longa discussão, concordaram que o
melhor lugar para esconder o ghee seria no interior de uma velha igreja,
construída pelos missionários europeus.
- O templo é um lugar tão sagrado como as árvores
cultuadas pelos povos que habitam as florestas. Ninguém vai ter coragem de
mexer ali – opinou o rato.
- É mesmo – apoiou o gato – Além disso o ghee
ficará protegido contra a ação de insetos e vermes.
À noite, protegidos pela escuridão, o gato e o rato
esconderam o pote cheio de ghee num canto da sacristia, onde o pastor
guardava os documentos da igreja.
Quando a estação das secas chegou, o gato e o rato
se alimentaram com os alimentos que armazenaram nos celeiros. Havia bastante
comida para os dois. Mas o rato não parava de pensar no ghee que eles
ocultaram na igreja.
- Será que não estragou? Como é que deve estar o
gosto agora? – pensava o pequeno roedor.
Morrendo de vontade de provar um pouquinho do ghee,
ele planejou uma boa desculpa:
- Tenho de ir à igreja. A filha da minha irmã vai
ser batizada e ela pediu que eu fosse o padrinho.
- Está bem – disse o gato, sem desconfiar de nada.
O rato, tão logo chegou na igreja, pegou o pote,
destampou-o e começou a comer.
- Ai que delícia – elogiava, com a boca toda
lambuzada de manteiga.
Antes de sair, cobriu a vasilha de barro e
guardou-a cuidadosamente no mesmo lugar.
- Como foi a festa? – perguntou o gato, assim que o
rato retornou com uma cara toda satisfeita.
- Foi ótima.
- Qual o nome que deram para o filho da sua irmã?
- Quase cheio, respondeu o roedor,
lembrando-se de como havia deixado o pote.
Dias depois, convencido de que o gato era mais
fácil de enganar do que imaginavam, resolveu provar mais um pouco de ghee.
- Fui convidado para outro batizado – mentiu ele.
Na volta, com a barriga estufada, disse que o nome
do recém-batizado tinha sido Metade.
- Que nomes estranhos a sua família dá aos filhotes
– comentou o gato, sem perceber que estava sendo passado para trás.
O rato decidiu continuar com suas incursões até que
o ghee acabasse. Ele, sempre que voltava da igreja, inventava nomes
novos para os parentes batizados, de acordo com o conteúdo do pote, que ia
diminuindo a cada visita. O último nome, lógico, só podia ser Vazio.
Quando a comida estocada nos celeiros acabou, o
gato chamou o rato e disse:
- Agora podemos pegar o ghee que estocamos
na igreja.
- Sinto muito, mas não posso acompanhá-lo, estou me
sentindo mal – desculpou-se o rato.
Então o gato foi até o templo sozinho. Quando ele
abriu o pote levou o maior susto.
- O quê? Não tem nada! – esbravejou – Isso não pode
ser verdade – lamentou-se o bichano, rolando de raiva pelo chão.
Quando o gato chegou em casa, pronto para dar a má
notícia, descobriu que o rato havia feito a trouxa e desaparecido no meio da
floresta.
- Só pode ter sido este traidor! Agora entendo os
nomes esquisitos que ele ia inventando: Quase Cheio, Metade, Um Pouco,
Pouquinho, Vazio...
Desde esse dia, o gato vive à procura do rato. Mas
o roedor, assim que escuta o miado do implacável perseguidor, foge correndo
para sua toca.
Nenhum comentário:
Postar um comentário